31 março 2015

Sobre cotas e resposta a alguns imbecis.

Primeiro gostaria de saudar minha ancestralidade, meu nordeste.

Eu sou descendente de uma escravizada, por mais que isto seja silenciado nas conversas familiares. O sobrenome de minha tataravó era Sciole ou Aciolli, nome de origem européia. Por tradição, aliás, por um ato que invisibiliza a memória de negros e negras os Srs. de Engenho os batizavam com seus sobrenomes; Este nicho familiar, comandou algumas capitanias hereditárias no nordeste brasileiro.

Em 2014, um dos candidatos a presidência da república era descendente desta família (Sciole ou Aciolli). "O bagulho é doido"! Aqueles mesmos que detinham o ''poder'' nas capitanias hereditárias são os mesmos que ainda detém ou disputam o ''poder'' hoje.

Antes de prosseguir com o pensamento gostaria de escurecer algumas coisas, primeiro, quando se fala em minoria, não nos referimos a quantidade populacional, mas sim sobre minorizados e minorizadas políticas, e isto existe sim. Somos em maioria, mulheres, negros e negras, porém politicamente são estes e estas que sofrem com maior violação de direitos. Daí concordamos, pois "nunca seremos uma nação enquanto tivermos dezenas de minorias". Precisamos mesmo que as políticas públicas e econômicas atendam toda a nação e não refiro-me a políticas de transferência de renda.

Alguns dados. De 50 mil assassinatos por ano na guerra civil brasileira, a grande maioria são jovens e negros. Anualmente são 50 mil mulheres estupradas, ainda há intensa disparidade salarial. Sobre negros, em certos setores da sociedade a questão se agrava ainda mais, nos quadros da Direita Brasileira, como exemplo, quantos negros você conhece? No PSDB? Quando olhamos para o Congresso Nacional, quantos índios, quantos negros e negras, quantas mulheres?

Por outro lado temos a Bancada da Bala, a Bancada da Bíblia, a Banca Ruralista...

Dito isto, espero que não cite minorizados e minorizadas de forma irônica ou desrespeitosa; Que entenda que lutar por vida e justiça não é vitimismo, ser cuspido dentro de um ônibus coletivo pelo fato de ser negro ou negra não é vitimismo, ser comparado a animais (macacos) não é vitimismo, viver com estereotipia da grande mídia não é vitimismo, saber que a foto solicitada no currículo será fundamental para permanência no desemprego não é vitimismo. Ser agredido com lâmpada fluorescente por sua orientação sexual, não é vitimismo. Será que a criança assassinada pelo pai por gostar de lavar louças e ser ''afeminada'' (sic) também se vitimizava?

Negar o racismo é sinal de imbecilidade. Negar o sofrimento e invisibilidade do próximo é sinal de inumanidade.

Sobre inconstitucionalidade, o STF diz o contrário, inclusive em resposta ao Arena, partido da Ditadura, hoje Democratas, que entraram na justiça exigindo isto. O interessante é que essa direita brasileira, a mesma dos Ruralistas – latifundiários, foi a que desde sempre usufruiu de Cotas para seus filhos e filhas, via Lei do Boi, conhece?

Mas "Mendigos se esforçam e entram na universidade" (sic). Irmãos e irmãs isto é tão raro que transformam-se em matérias da Globo, daí estamos aqui acreditando nisto, mas é o contrário, a população de rua é acometida diariamente, é exterminada, é violentada e é - em maioria - negra.

Sim, todos e todas nós temos as mesmas capacidades intelectuais, porém precisamos entender que somente 100 anos depois a falsa abolição houve a universalização da educação e mesmo assim, é importante olharmos para a realidade de nossas quebradas e responder: Quantas escolas de ensino médio possuímos? Quantos teatros e cinemas públicos? Quantas universidades existem nas periferias? Nos meus 15 anos de vida estudantil em apenas UM DIA fui a um laboratório, NUNCA visitei um planetário, nunca tive um auditório digno para apresentações teatrais. E isto, interfere ou não no momento em que responderei as perguntas num vestibular?

Vejamos as políticas inclusivas desta maneira:

Metrô lotado. Idosos, gestantes, obesos e deficientes têm mais dificuldade de permanecer em pé. (PS. isto também é política afirmativa). Diante disto nós esperamos a solidariedade do povo que insiste em fingir que está dormindo, ou vamos criar leis específicas para garantir o mínimo de dignidade?

Sobre as cotas raciais e sociais é o mesmo. É urgente que aja maior investimento na educação de base, claro, daí garantiria o acesso de negros, negras e pobres num futuro. Porém, as cotas são hoje, uma forma de acabar com o Racismo Institucional, ou seja, precisamos sim, de mais professores e professoras negras, de médicos e médicas negras, de promotores e promotoras negras, de atores e atrizes negras, que não sejam apenas prostitutas, bandidos, escravizados e escravizadas.

Por fim, não são as Cotas que vão nos dividir, não. Quem fez e faz brilhantemente isto é o Capital. É... esse mesmo que põe soda cáustica em leite para lucrar mais.

Um comentário:

tarcísio disse...

Markão mais Uma vez você sábio e sensato em seu texto, aprendo muito com você irmão, quando te chamo de irmão chamo de verdade sem medo de errar por que irmandade é isso é se reconhecer enquanto irmão e irmãs de luta que não se curva perante a mentiras dos opressores temos sim que ser portavoz de nos mesmos se munir de informação e conhecimento para enfrentar o opressor com nosso intelecto e mostrar que não caímos mais no conto do vigário, querem nos catequizar de novo com suas mentiras e falacias mas estamos ligeiros, mais uma vez obrigado por essa aula de empoderamento! Abraço fraterno irmão!!!